Autor: Pr. Eli Maga – Presidente dA Tarefa
Certa vez, Jesus advertiu seus discípulos de que não adianta conquistar o mundo inteiro se isso custasse a própria alma (Marcos 8:36). Dois mil anos depois, esse alerta se mostra mais atual do que nunca para a igreja. Raramente se ouviu falar de tantos pastores e missionários mergulhados em depressão profunda, e os casos de suicídio têm se tornado cada vez mais frequentes. Nos Estados Unidos, 46% dos pastores relatam lutar com algum grau de depressão1. Essa dolorosa realidade se espalha entre os evangélicos no Brasil, sem se restringir a uma denominação específica: atinge igualmente igrejas históricas e pentecostais, em diferentes tradições e linhas de fé.
No campo missionário, o cenário não é diferente. Muitos servos sofrem em silêncio, enfrentando ministérios árduos e marcados pela solidão. Quando suas crises vêm à tona, muitas vezes são taxados de fracos moralmente ou derrotados espiritualmente. A ausência de entendimento de líderes, igrejas e organizações missionárias quanto à dimensão da saúde mental contribui para que o obreiro permaneça calado, acumulando novas enfermidades às já existentes. O temor de perder o sustento, o apoio de parceiros ou até mesmo o ministério faz com que esconda suas lutas contra a ansiedade, a depressão e outras doenças da mente. Em muitos casos, o resultado é ainda mais doloroso: o missionário é deixado de lado justamente por aqueles que deveriam cuidar e sustentá-lo em suas fraquezas. Será que nos tornamos um exército que se acostumou a abandonar seus feridos no campo de batalha?
A pergunta mais importante, entretanto, não é esta. O que realmente precisamos compreender é: por que estamos tão exaustos, ansiosos e abatidos? O burnout — síndrome provocada por um estresse contínuo, intenso e prolongado — tornou-se uma verdadeira epidemia entre pastores e missionários. Há estimativas de que, mensalmente nos Estados Unidos, cerca de 1.500 ministros deixam o ministério devido ao burnout
Paradoxalmente, passou a ser quase um título de honra um pastor admitir sofrer de burnout, como se isso revelasse maior dedicação ao ministério. Mas, em essência, o que essa condição revela sobre nós, nossas igrejas e sobre como temos conduzido nossa vida e vocação? Mais importante ainda: o que isso mostra do que entendemos ser o cristianismo?
Precisamos discernir o que tem levado pastores e missionários ao limite de tirar a própria vida ou, em tantos casos, abandonar o ministério, a família e até mesmo a fé em meio a crises de profundo desespero. É um tema delicado e complexo, mas trago aqui uma breve reflexão fruto do que tenho observado. Afinal, talvez você mesmo esteja enfrentando a ansiedade, ou sendo pastoreado por alguém à beira do esgotamento, ou sustentando um missionário afundado em depressão. Não pretendo que estas palavras soem como julgamento para quem carrega tais dores. O que compartilho é um convite à reflexão — para mim e para você. Um toque de trombeta, conclamando-nos a manter os olhos despertos, os ouvidos atentos, e o coração sensível.
Expectativas elevadas e a cobrança por performance
Creio que uma das razões pelas quais tantos pastores e missionários chegam ao limite — alguns tirando a própria vida — é a carga de expectativas que depositamos sobre eles. Exigimos profundidade bíblica e excelência ministerial, mas pouco nos importamos com sua saúde emocional e espiritual. Queremos pregadores eloquentes nos púlpitos e missionários destemidos nos campos, mas raramente perguntamos se estão experimentando, de fato, uma vida abundante em Deus. Esperamos que cuidem de todos, mas nos esquecemos de que eles também são ovelhas que precisam ser pastoreadas.
O ministro é chamado a pregar com clareza, aconselhar com discernimento, administrar a igreja ou o campo missionário com habilidade, mediar conflitos, levantar recursos, supervisionar obras, liderar pessoas e ministérios — e ainda ser filho, pai, marido e cidadão. Na prática, a jornada ministerial dura muito além de oito horas diárias, muitas vezes sem sequer um dia de descanso semanal devido às demandas incessantes do ministério. Quando falham em alguma dessas funções, não apenas carregam a culpa em silêncio, mas também sentem o peso da frustração vinda da igreja ou de sua organização missionária.
A cobrança por resultados é uma realidade esmagadora no ministério. O missionário sente-se compelido a apresentar relatórios impressionantes para garantir o apoio financeiro de sua igreja. O pastor, por sua vez, mede o valor de seu trabalho comparando o número de membros de sua comunidade com as estatísticas de megaigrejas, julgando-se, muitas vezes, um fracasso. Essa pressão não é apenas interna, mas também externa: há uma expectativa constante por maior produtividade, quase sempre expressa em números — quantidade de batismos, crescimento de membros ou aumento das entradas financeiras.
É verdade que existem líderes, tanto pastores quanto missionários, que se acomodaram em uma rotina de mera manutenção, agarrados a uma posição apenas para assegurar sustento, sem paixão ou visão de expansão do Reino. Contudo, acredito que estes são a exceção, não a regra. A maioria carrega o peso de cumprir demandas quase impossíveis. Por isso a igreja precisa ser mais sensível à carga que impõe sobre seus obreiros, ou que eles impõem a si mesmos.
Leia também:
Cuidando de quem cuida – Parte 2
Fontes:
2 https://lausanne.org/global-analysis/burnout-among-missionaries